16 de mai. de 2010

Banco de cérebros do Colorado (EUA) quer ajudar a descobrir a causa e a cura da esclerose múltipla

Matéria publicada em: 13/05/2010

                  
Montagem da exposição "Cérebro - O mundo dentro da sua cabeça", em São Paulo

Jennifer Brown
The Denver Post
Em Denver, Colorado (EUA)
UOL
                


A sala grande e gelada zumbe devido ao funcionamento de dez ventiladores de resfriamento e 62 freezers gigantescos, máquinas de tecnologia tão sofisticada que são capazes de enviar mensagens de texto para advertir sobre a presença de invasores ou para transmitir um alerta quando a temperatura cai muito abaixo de -80ºC.
Câmeras vasculham esse local do campus de medicina da Universidade do Colorado, protegendo os objetos valiosos que estão congelados lá dentro: fragmentos de câncer de próstata, células-troncos embrionárias e fatias de cérebro humano danificado pela esclerose múltipla.
“Para mim, é como caminhar em direção a uma zona de penumbra”, diz Karen Wenzel, diretora-executiva do Centro de Esclerose Múltipla das Montanhas Rochosas.
Com a recente mudança das instalações do banco de cérebros do centro, a universidade torna-se o local em que se encontra a maior coleção exclusiva de cérebros humanos afetados pela esclerose múltipla na América do Norte, com o objetivo de encontrar a causa e a cura dessa doença neurológica.
O banco possui cerca de 350 fatias de cérebros e, no futuro, com a instalação de freezers adicionais, ele terá capacidade para armazenar milhares desses órgãos nas suas novas instalações de alta tecnologia.
A pedido de cientistas de todo o mundo que pesquisam a esclerose múltipla, as amostras de cérebros são embaladas em gelo seco e isopor e remetidas por via aérea no dia seguinte às solicitações.
“A esclerose múltipla pode ser uma doença bastante devastadora, e nós ainda temos muito o que aprender a respeito dos fatores biológicos dessa doença”, afirma o médico Timothy Vollmer, que é neuroimunologista e professor da Escola de Medicina do Colorado.
Pelo menos 400 mil pessoas nos Estados Unidos sofrem de esclerose múltipla, e no decorrer de um período de 15 anos após a manifestação da doença, cerca da metade desses indivíduos terá que utilizar cadeiras de rodas ou andadores.
A melhor maneira de estudar a esclerose múltipla é examinando o cérebro de um paciente que morreu. Escaneamentos de cérebros de pessoas vivas mostram faixas cinzentas nas quais a substância cerebral denominada mielina morreu.
No interior desse tecido cicatricial, o cérebro luta para enviar mensagens indicando como o corpo deve se mover ou como o indivíduo deve pensar. Mas para estudar a doença em um nível celular, os cientistas precisam observar esse tecido sob o microscópio.
Sandee Walling, que foi diagnosticada com esclerose múltipla 16 anos atrás, é uma das 1.400 pessoas que comprometeram-se a doar os seus cérebros ao banco das Montanhas Rochosas quando morrerem.
“O mínimo que eu posso fazer para todos é tentar contribuir com algo para que se encontre uma causa e uma cura”, explica Walling, uma mulher de Denver cuja doença a deixou sensível ao calor e à percepção de profundidade. Logo após ser diagnosticada com a doença ela usava um andador, mas agora acredita ter recuperado a mobilidade com a prática de pilates terapêutico e ioga.
“Eu sei que isso é algo que eu tenho que fazer”, resume ela.
Muitos pacientes que planejam doar seus cérebros veem esse ato como “um último murro na esclerose múltipla”, diz Wenzel. “O indivíduo sente que o seu cérebro pode ser aquele que possibilitará a descoberta da causa e da cura da doença”.
O fato de o maior banco de cérebros dedicado exclusivamente à esclerose múltipla ficar no Colorado faz sentido, já que este Estado está localizado no epicentro da doença, explica a médica Bette Kleinschmidt-DeMasters, uma professora de neurologia que verifica o diagnóstico de esclerose múltipla em cada um dos cérebros doados.
Cerca de um em cada 580 habitantes do Colorado sofre de esclerose múltipla – o que representa um dos índices mais elevados de incidência dessa doença nos Estados Unidos.
“É algo como estudar a malária e morar na África”, diz ela. A esclerose múltipla tem maior incidência aos 40 graus de latitude norte, um paralelo terrestre que passa pela cidade de Boulder.
A causa da doença é desconhecida, mas os cientistas observam que há “indícios impressionantes” de que a esclerose múltipla é desencadeada por algum tipo de infecção, diz DeMasters.
A doença é provocada por uma combinação de fatores genéticos e de toxinas ambientais – os pesquisadores estão investigando, por exemplo, a combinação do fumo e de um histórico de infecção por mononucleose –, mas os cientistas ainda não descobriram o fator chave para prever e prevenir a esclerose múltipla .
A doença aparece tipicamente por volta dos 30 anos de idade, e as mulheres apresentam duas vezes mais probabilidade do que os homens de sofrerem de esclerose múltipla.
O custo médio da remoção de um cérebro e do seu envio para o banco é de US$ 1.500 (R$ 2.660). O banco também coleta tecidos da coluna vertebral de pacientes com esclerose múltipla. As verbas para as atividades de pesquisas são oriundas da Sociedade Nacional da Esclerose Múltipla.
Desde 2004, mais de 90 pesquisadores em todo o mundo requisitaram tecidos do banco de cérebros. O trabalho resultou na publicação de mais de 20 trabalhos de pesquisa.
Os pesquisadores das universidades acreditam que as respostas para o enigma da doença dependem de uma combinação dos trabalhos de cientistas de todo o mundo.
“Pode demorar dois, três ou dez anos até que alguém encaixe as peças do quebra-cabeças para poder afirmar qual é a causa da esclerose múltipla”, explica DeMasters. “A coisa não é tão simples, caso contrário nós já teríamos encontrado uma resposta”.

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