Atualização: 28/01/2010
Estudo feito com camundongos poderá permitir a produção em massa de células nervosas para uso terapêutico
A criatividade dos cientistas para superar as complicações éticas que envolvem as pesquisas com células-tronco embrionárias parece não ter fim. Primeiro inventaram uma maneira de reprogramar geneticamente células da pele para se comportarem igual às embrionárias, com capacidade para se transformar em qualquer tecido do organismo. Agora fizeram algo ainda mais prático: inventaram uma técnica semelhante para transformar células da pele diretamente em neurônios, sem passar pela etapa de "tronco".
Em tese, isso permitiria produzir neurônios in vitro, em grandes quantidades, para o tratamento de lesões e doenças que afetam o sistema nervoso, como traumas medulares, esclerose múltipla ou Parkinson. As células seriam derivadas da pele do próprio paciente, sem risco de rejeição.
Batizadas de neurônios induzidos (iN, na sigla em inglês), as novas células foram capazes de formar sinapses e transmitir impulsos elétricos in vitro, um forte indício de que são células funcionais. Ou seja: não só parecem neurônios, mas também funcionam como tal. "Podemos dizer que nossas células são qualitativamente equivalentes a neurônios verdadeiros", disse ao Estado o pesquisador Thomas Vierbuchen, da Universidade Stanford, que realizou os experimentos.
As células ainda não foram testadas em animais, apenas in vitro. Outra ressalva é que a técnica só foi testada em células de camundongo. Mas a expectativa é grande de que funcione também em células humanas.
Foi o que aconteceu com as células-tronco de pluripotência induzida (iPS), que substituíram as embrionárias como grande aposta dos cientistas para um eventual uso terapêutico. O trabalho pioneiro foi publicado em 2006 por uma equipe japonesa, utilizando células de camundongo. Passados quatro anos, a técnica ainda está longe de ser incorporada como terapia, mas já foi amplamente testada em células humanas e aperfeiçoada de várias formas, com resultados promissores em dezenas de laboratórios.
Os cientistas de Stanford agora torcem para que as células iN sigam a mesma trilha de sucesso das iPS. A técnica usada nos dois casos para induzir a transformação celular é a reprogramação genética. No caso das iPS, os cientistas introduzem nas células da pele uma combinação de genes que fazem com que elas percam sua especificidade e voltem a funcionar como células "pluripotentes", equivalentes às embrionárias, com capacidade para se diferenciar em qualquer tipo de célula, por exemplo, fibras musculares ou neurônios.
No caso das iN, os cientistas identificaram três genes capazes de transformar a pele diretamente em neurônio, sem passar pelo estágio embrionário. "Eliminaram o atravessador", nas palavras da revista Nature, em que a pesquisa foi publicada.
Os genes usados no processo são conhecidos como fatores de transcrição, que controlam a atividade de vários outros genes. Eles foram selecionados de um grupo inicial de 19 genes desse tipo que são tipicamente ativos em células neuronais.
A eficiência da transformação foi excelente, na faixa dos 20%. E rápida: levou apenas de cinco a seis dias.
Todos os neurônios produzidos eram de um tipo específico, que transmite informações por meio de uma molécula chamada glutamato.
Os cientistas não conseguiram produzir células com outros tipos importantes de neurotransmissores, como dopamina e serotonina. Segundo Vierbuchen, isso pode ser uma característica dos genes usados na reprogramação.
O plano agora é testar outras combinações genéticas, para ver se é possível produzir outros tipos de neurônios , assim como outros tipos de células.
Um comentário:
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